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Crônica de uma final surpreendente

 Vi um time unido, perfilado em campo como um corpo único, vibrante, com um pensamento unicamente voltado para a vitória

Por Henrique Xavier

Em geral, fazer um texto não é difícil para um jornalista. Como tudo na vida desse profissional, basta que ele siga um método. Descrever uma partida de futebol, entretanto, requer um preparo muito maior, pois desvendar os mistérios das quatro linhas e se fazer entender é muito complicado, exige paciência, discernimento, frieza e até um pouco de poesia.

O que vi naquela tarde da última terça-feira (19) vai bem além de uma simples final de campeonato, por isso tentarei de algum modo descrever alguns detalhes que podem ter passado despercebidos aos que estavam prestigiando a disputa pelo lugar mais alto no pódio da Copa Jubileu.

A partida reunia, de um lado, o “Verdão”, o poderoso Comdasp, a grande máquina de fazer gols, que chegara invicta na final e em cujo plantel estavam quatro dos 10 melhores jogadores da Copa, incluindo o goleiro menos vazado. Jovens, bem treinados, com uma zaga de respeito e um meio de campo de meter medo até no Van Damme, o Comdasp não tinha pena dos seus adversários. Do outro lado, havia o time do SIFAM/GCAD, repleto de atletas um pouco acima do peso, mais modestos em se tratando de linha defensiva, mais lentos e, de quebra, com o jogador mais velho da competição, com admiráveis 69 anos.

As duas equipes já haviam se encontrado na primeira fase da Copa e, evidentemente, como era de se esperar de um time favorito, o Comdasp sapecou no tricolor notáveis 6 a 4. Tudo nos conformes. Poderia até encerrar esta crônica aqui, informando aos leitores mais impacientes que tudo acabou bem para o Verdão, que chegou consciente do seu papel de favoritíssimo ao título, mas estaria sendo leviano em relação às nuances dos desígnios premeditados pelos deuses do futebol.

O certo é que, naquela tarde, o time do SIFAM/GCAD, desfalcado do seu principal reforço na zaga, sob a batuta do maestro Ruy Barbosa Violante, foi a campo com a vívida intenção de não levar gols do adversário e viera preparado para levar pressão de tudo que é jeito. Me reservo o direito de comentar aqui como foi notável a energia diferente que fluiu daquela humilde conversa entre Violante e os seus jogadores, onde palavras simples exaltavam a qualidade do escrete tricolor e a importância do jogo em equipe, de como todos – independente do placar final, já eram vitoriosos apenas pelo fato de terem chegado até ali e para que todos jogassem com o coração na ponta da chuteira.

No campo do Verdão, a preleção foi magnânima, com o técnico Frank Bandeira enaltecendo as inúmeras qualidades dos favoritos ao título e falando o que todos já sabiam: o Comdasp seria o campeão pelo poder de ataque dos seus jogadores e pelo querer divino a eles concedidos a partir de sua fé na crença religiosa. Concluídas as últimas instruções e estratégias de ataque, os verde-brancos entoaram em altos brados sua prece e o seu grito de guerra.

Embalados pelo som que vinha das mixagens feitas por mãos bem treinadas na cabine de som, a torcida do Comdasp chegou em peso para apoiar e aplaudir seus craques e o time de notáveis da crônica esportiva, que foi chamado para avaliar os melhores em campo naquela partida.

Por outro lado, posso afirmar categoricamente que a tarde serena, seja por mera vaidade ou ostentação, também tinha os seus caprichos e pareceu sentir a adrenalina que fazia os corações daqueles atletas baterem mais forte. Após um período de sol causticante, o céu foi aos poucos se fechando, deixando no ar um “quê” de ansiedade que fugia aos parâmetros do usual.

Nem mesmo as notas musicais entoadas pelas doces vozes treinadas do coral conseguiram desanuviar o clima de expectativa pelo confronto. Pude notar em campo que os craques da ‘máquina verde’ pareciam impacientes, talvez nervosos, como as gotas de chuva que aos poucos desabaram sobre o gramado.

Quem deixou de perceber (?) que esse clima de tensão vivido ao longo do primeiro tempo contrastava com a festa na arquibancada, com as gargalhadas contagiantes da torcedora fanática, com as iguarias servidas mesmo antes do intervalo, deixando todos em êxtase, e até o toque de bola moleque de encher os olhos e dar orgulho a grandes partidas outrora vividas ou presenciadas no futebol brasileiro.

Ah, o futebol! Essa caixinha de surpresa que empolga a todos que o assistem em suas riquezas de detalhes, como os olhares perplexos que o treinador do Comdasp deixava escapar ao ver o adversário, decantado como mais fraco, não apenas suportar com destreza os ataques do seu time, como ainda sair em vantagem no marcador aos quatro minutos do segundo tempo. Os detalhes, aliás são a tônica dos confrontos no futebol, e foi uma bola perdida na zaga o determinante para o empate um minuto depois.

O espocar de fogos de artifício no céu nublado deu a dica que aos 26 minutos, o SIFAM/GCAD pulava novamente na frente e que aos 32’ o Verdão empatava a partida, forçando a cobrança dos tiros livres.

O futebol, como a vida, nos ensina que nem sempre o mais bem preparado ou o mais forte é o que vence. E foi assim que, naquela tarde que guardarei em um lugar muito especial em minhas lembranças, vi um time unido, perfilado em campo como um corpo único, com um pensamento unicamente voltado para a vitória, preparado para enfrentar de igual para igual uma equipe bem mais poderosa e, a despeito de todas as projeções negativas que faziam acerca de sua capacidade, conquistar o título da Copa Jubileu e alcançar a glória…

One thought on “Crônica de uma final surpreendente

  • Cristóvão Silva

    Crônica magistral de um cronista histrionico…👏👏👏👏👏

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